quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Revista super interessante


Discos voadores: E a nave vem

Pelo menos na imaginação da muita gente, os objetos voadores não-identificados são

 naves de outros planetas. A ciência não leva isso a sério, mas algumas aparições nunca 

foram bem explicadas

Das 21 horas da segunda-feira, 19 de maio de 1986, aos dez minutos do dia seguinte,
 os radares da Aeronáutica registraram a presença de um objeto luminoso
 não-identificado nos céus do eixo Rio — São Paulo. O objeto se deslocava a
 velocidade supersônica e fazia manobras absolutamente impossíveis para um avião.
 Tão logo foi percebido, seis caças da FABlevantaram vôo para observar 
o estranho fenômeno.
Os pilotos disseram depois ter visto focos de luz irradiados nas cores
 verde e vermelha. Eles não fizeram contato com o objeto nem
 conseguiram explicá-lo. De uma coisa tiveram certeza: não se tratava de qualquer
 tipo de aeronave conhecida. Mais tarde surgiram as costumeiras hipóteses:
 era o planeta Vênus, era um satélite reentrando na atmosfera, era uma sonda.
 E, como sempre, houve quem jurasse: os sinais luminosos pertenciam a uma nave 
espacial de outro planeta, um disco voador.
Desde 1947, quando o piloto norte-americano Kenneth Arnold lançou a expressão
 disco voador, essas naves têm freqüentado, senão o espaço real, pelo menos as
 histórias contadas por aviadores, funcionários de aeroportos e os mais variados 
tipos de pessoas. Tanto que o misterioso objeto visto nos céus do Brasil em
 1986 não foi um caso único no país. No dia 8 de fevereiro de 1982, uma 
esquadrilha da FAB tentou, sem sucesso, descobrir que objeto perseguiu
 um Boeing da VASP durante boa parte da viagem de Fortaleza ao Rio.
 A aparição foi também testemunhada pelas tripulações de dois outros jatos.
Episódios como esses entram para o alentado anedotário dos OVNIs, os objetos
 voadores não-identificados, que nesses últimos quarenta anos conquistaram 
um lugar seguro na imaginação popular, até porque tem mais graça supor que 
existe vida inteligente em outros planetas e que uma luz diferente no céu é 
uma nave cheia de marcianos do que um reles fenômeno meteorológico.
Por outro lado, como nem sempre as pessoas tomam conhecimento das explicações 
afinal encontradas para uma aparição misteriosa, sobrevive no ar a atraente idéia de
 que um OVNI é produto de alguma civilizaçãoextraterrestre. As histórias em quadrinhos, a literatura e o cinema só fizeram reforçar essa crença.
Segundo os ufologistas — palavra que veio do inglês UFO (Unidentified Flying Object)
 — já foram registrados 200 mil casos de objetos voadores não-identificados no mundo
 todo, dos quais 10 mil apenas no Brasil. Eles próprios, no entanto, tratam de separar
 bem as coisas. "Cerca de 90 por cento dos casos não são fenômenos ufológicos, mas
 fraudes ou erros de interpretação", calcula o engenheiro Claudeir Covo, fundador do
 Centro de Estudos e Pesquisas Ufológica de São Paulo, um dos vários grupos formais
 e informais de interessados no assunto existentes no país. Claudeir, um ufologista 
com os pés no chão, baseia suas contas nas constatações atribuídas ao ATIC (Air Technical Intelligence Center), o serviço de contra-espionagem aérea dos Estados Unidos
 encarregado de localizar e identificar qualquer aparelho que sobrevoe o país.
O Projeto Blue Book, ou Livro Azul, do ATIC, mostrou que quase todos os 13 mil casos
 de OVNIs relatados em vinte anos de estudo são na verdade fenômenos astronômicos e meteorológicos. Entre os astronômicos estão o brilho de planetas, meteoros,
 estrelas cadentes. Entre os meteorológicos estão os casos de auroras, 
fogos-de-santelmo, descargas elétricas em tempestades. Mais prosaicamente ainda,
 há pessoas que enxergam OVNIs onde só há aviões, balões, reflexos de holofotes, 
gases poluidores, satélites artificiais, mísseis — ou a combinação de qualquer um
 desses elementos com fenômenos da natureza. Radares, por exemplo, podem ser 
enganados por interferência eletrônica, reflexos de nuvens ionizadas, chuvas e 
diferenças de temperatura.
Outra explicação que não pode ser desconsiderada tem a ver com a mente humana.
 Num estudo de 1958, o psicanalista suíço Carl Jung (1875-1961) afirmou que os discos
 voadores seriam alucinações provocadas por ansiedades coletivas que ocorrem em
 períodos de crise ou tensão internacional. Seriam portanto uma versão moderna das
 visões de santos e demônios tão comuns na Idade Média. Segundo essa interpretação,
 o homem da era espacial espera ser salvo de seus problemas cotidianos não por anjos, 
como antigamente, mas por seres extraterrestres.
Talvez por isso, muitos ufologistas acreditam que ETs estiveram presentes quando
 o profeta Elias, como conta a Bíblia, subiu aos céus numa carruagem de fogo; 
ou quando os egípcios veneravam o Sol, representado como um disco de ouro
 com asas; ou, ainda, quando os persas acrescentaram a essa representação 
uma cauda e duas patas que, com alguma boa vontade, podem ser comparadas
 a trem de aterrissagem. Os ufologistas também encontram ETs nos livros da
 mitologia hindu que falam de discos destruidores, dotados de raios de fogo.
Com tudo isso, compreende-se por que ver um OVNI é fácil — o difícil é fazer com 
que alguém acredite. No Brasil, os únicos que levam tais visões a sério são os
 grupos de estudos ufológicos. "De cada dez pessoas que fazem parte desses grupos, 
treze são piradas", brinca o engenheiro eletrônico Ricardo Varela, do Instituto de 
Pesquisas Espaciais (INPE), referindo-se à salada de místicos, curiosos e visionários
 de todo tipo que se abrigam nas sociedades ufológicas. O engenheiro Varela, que 
trabalha no lançamento de balões à estratosfera, até que se interessa pelos 
OVNIs — uma exceção no meio científico. Pois, sob o argumento de que não
 trata de fatos comprovados, a discussão do assunto passa ao largo das universidades
 e instituições de pesquisa.
Os cientistas reagem com impaciência, até mesmo com desagrado, às sugestões 
de estudos ufológicos. "Qualquer coisa que se disser sobre o assunto é puro 
chute ou crença pessoal", afirma o astrofísico Roberto Boscko, da USP.
Ele acredita que boa parte dos astrônomos pensa em disco voador "como sinônimo
 de pilantragem". Mas por que os OVNIs despertam uma reação tão violenta? Afinal,
 ver um deles não significa automaticamente entrar de sócio no fã-clube dos
 discos voadores — indica apenas alguma coisa incompreendida. E numa época
 em que satélites humanos se afastam dos limites do sistema solar com mensagens
 do planeta Terra, seria natural que a ciência estudasse a possibilidade de algo
 parecido "do lado de lá" — até para derrubar, uma a uma as histórias de discos,
 se for o caso.
O mistério dos OVNIs surgiu logo depois da Segunda Guerra Mundial, quando
 Estados Unidos e União Soviética trocavam ameaças e xingamentos cada vez
 mais ferozes e as pessoas comuns, escaldadas pela invenção da bomba atômica
 pouco antes, desconfiavam seriamente que os dois lados tinham verdadeiros
 arsenais de armas secretas. Em junho de 1947, o piloto norte-americano
 Kenneth Arnold contou ter sido perseguido por uma esquadrilha de naves
 em formato de pires (flying saucers, ou pires voadores), quando sobrevoava
 o pico Rainier, de 4 300 metros, no extremo noroeste dos Estados Unidos. 
Não tardou para a imprensa sensacionalista projetar na imaginação popular 
um clima de paranóia — ou eram os russos que estavam chegando, ou eram
 mesmo os marcianos.
Dos Estados Unidos, a publicidade sobre os OVNIs correu mundo e animou
 visionários de todas as cores, credos e nacionalidades. No Brasil, os pires
 voadores tornaram-se discos, embora algumas vezes fossem avistados sob
 a forma de charutos, sondas ou bolas. Em junho de 1952, a revista O Cruzeiro 
eletrizou o público com relatos de supostos discos voadores fotografados na
 Barra da Tijuca, no Rio. Os marinheiros do navio Almirante Saldanha contaram
 ter visto, em 1958, vários OVNIs sobre a ilha de Trindade, na costa do
 Espírito Santo, quando faziam pesquisas para o Ano Geofísico Internacional.
 E até hoje existem pessoas que juram ter conversado com ETs, viajado em
 discos e ouvido mensagens telepáticas de outros planetas.
Um dos casos mais célebres em todo o mundo foi o chamado Incidente de Roswell, 
sobre um disco voador que teria sofrido um acidente no Estado do Novo México,
 nos Estados Unidos, em 1947. No acidente, teriam morrido os tripulantes,
 cujos corpos teriam sido levados em segredo pela Força Aérea para estudos.
 No começo do ano passado, ufologistas fizeram o maior alarde exibindo
 documentos antigos do governo dos Estados Unidos confirmando o episódio.
 Na verdade, provou-se meses depois que os documentos eram falsos de cabo a rabo.
Bem antes, em 1968, um estudo da Universidade de Colorado, revisto pela 
Academia de Ciências dos Estados Unidos, declarou oficialmente que não 
existem discos voadores. O astrofísico norte-americano Allen Hynek, que
 participou do Blue Book, não se conformou com o resultado e declarou que
 as pesquisas de Colorado tinham sido dirigidas a fim de apresentar uma explicação
 tranqüilizadora para o público. Hynek, que morreu no ano passado, era diretor
 do Centro de Estudos Ufológicos dos Estados Unidos, sendo considerado um 
dos maiores especialistas em OVNIs.
Depois, os fãs dos OVNIs como que passaram para a clandestinidade. Atualmente, 
eles se concentram nas sociedades de ufologistas que funcionam como verdadeiras 
seitas. Alguns ainda tentam explicar os fenômenos dentro dos limites da ciência
 acadêmica, aproveitando os conhecimentos sobre a origem da vida e as leis da 
natureza, com as quais os discos estariam relacionados. Outros ligam o aparecimento 
dos discos a fenômenos paranormais e às tradições orientais.
E, por menos que a ciência e o bom senso lhes dêem crédito, a crença em que 
os discos existem vai bem, obrigado. No ano passado, três livros sobre o assunto 
foram lançados nos Estados Unidos. Venderam como pão quente.

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